19 setembro 2006

Entrevista a Derradê

Bom dia leitor. Estou aqui para lhe dizer que mais uma (grande) entrevista foi realizada em exclusivo aqui para a ÁreaBD! Desta vez tivemos de interromper Derradê que estava tranquilamente no WC... E não é que ele aceitou?
E entrevista foi feita por e-mail e conduzida pelo CESAR e por mim. Sem mais apresentações (acho que todos sabem quem é o grande Derradê) aqui vai a entrevista!


ÁreaBD - Antes de mais, obrigado por aceitar em responder à entrevista e por nos dar uma dose bi-mensal de humor em BD. Em primeiro lugar, queríamos perguntar qual foi o seu primeiro contacto com a Banda Desenhada em si. O Derradê começou pela Disney ou pelos Franco-Belgas?

Derradê - Principalmente pela Disney (da Abril pré-Morumbi): Mickey, Tio Patinhas, Disney Especial, Almanaque Disney (mensais), Zé Carioca e Pato Donald (quinzenais). Também pela Mónica e Cebolinha do Maurício de Souza. Comecei através dos livros e revistas do meu primo, que é 7 anos mais velho do que eu e me ensinou a desenhar, o que implica que também já lia Franco-Belga pois ele comprava a revista TinTin. Comics não tanto mas ainda assim lia alguma Marvel(Bloch) e DC(Ebal). Tudo Brasileiro. O engraçado é que hoje em dia a malta tem gostos extremados, se gosta de mangá não suporta Franco-Belga, se gosta de Franco-Belga não suporta Comics, se gosta de Comics não suporta Mangá. Mesmo no meu maior período de consumo Marvel (início da Homem-Aranha, Super Aventuras Marvel,...) nunca deixei de consumir Franco Belga, principalmente por alturas da Feira do Livro (raramente ia a livrarias de Lisboa o resto ano), e nunca larguei a Disney (é o efeito que o Carl Barks deixa numa pessoa).



A partir de que altura é que começou a desenhar a sério?

Essa altura ainda está para vir, mas comecei a publicar no Jornal Regional Mensal Notícias de Alverca em 1991 (tinha então 20 anos), co-lancei o meu primeiro fanzine em 1992 (o The BadSummerBoys Fanzine, com o Geral - o maior argumentista português vivo, é a minha opinião, lamento) e publiquei o meu primeiro livro em 1999 (Fúria, Edições Polvo).


Desde que começou a ler BD teve logo aquele sonho de poder desenhar BD ou só com a idade é pensou em seguir essa carreira?

Quando em pequenos nos perguntam o que é que queremos ser quando formos crescidos, eu costumava responder "Walt Disney e Astronauta" - eu julgava que o sr. Disney é que fazia aquelas histórias todas e os filmes que eu via, e na altura julgava que Portugal era um grande país, com foguetões e tal.


Quais foram as reacções da família ao saberem que se ia tornar um desenhador pseudo-intelectual?

Depois de pararem de rir, o que ainda levou algum tempo, tiveram reacções diversas: tentativas de internamento em hospitais psiquiátricos ou asilos, corte de relações e mesmo tentativas de assassinato, quer físico quer psíquico. Mas como são da família temos de a aguentar, não é? Mas também deixei de lhes oferecer presentes nos aniversários...


Deduzimos que desenhar seja um part-time. Tem algum outro trabalho a tempo inteiro?

Sim, confirmo, desenhar é um Part-Time. Sou Pai de 3 meninas e Marido da minha mulher, o que me ocupa o tempo todo. Quando era jovem e descomprometido licenciei-me em Matemáticas Aplicadas e fui Analista/Programador durante 10 anos. De momento escrevo, desenho, monto, promovo e trato da gestão da Velvet Underground, proprietária da HL Comix, mas só nos momentos em que a minha vida particular me deixa.


De todos os seus trabalho, qual foi aquele que lhe deu mais gozo fazer?

As minha filhas sem dúvida. As tentativas e repetições que, cada vez mais raramente, vou fazendo. Existe a regra que o trabalho actual é o que dá mais gozo de fazer, e fazer a HL Comix dá-me um gozo muito particular, mas gostava de destacar o "A 25 Sempre a Abril!". Pelo trabalho de pesquisa que implicou, pelo trabalho que deu apertar com o argumentista, pelo trabalhar uma época tão especial da história portuguesa, e tão mal compreendida, e por ser o trabalho de maior fôlego que já fiz - realizado em 28 noites e fins-de-semana consecutivos durante o mês de Fevereiro de 2002.


Se pudesse qualificar as suas obras, como o faria?

Apressadas. Ah, como gostava de poder ter mais tempo (seguido, sem interrupções) para dedicar às minhas BD’s...


Agora, no capítulo referente à sua mais recente produção, como é ser o criador de uma revista como a HL Comix?

É um grande gozo, prazer, satisfação, ser o criador de uma impossibilidade real (uma revista independente portuguesa de BD), e no entanto ela existe. O poder fazer, literalmente, o que quiser e publicá-lo e depois vê-la ganhar vida própria, sair das nossas mãos e ir por essas bancas fora (que na minha opinião é o local por excelência da BD) tentar fazer pela vida enche-me de orgulho.


Em outras entrevistas já admitiu que a HL bebe inspiração de Chiclete com Banana de Angeli, mas já admitiu que não se compara a Angeli, o seu criador. Mas relacionando a HL à CcB, diga-nos em que é que elas são parecidas?

O estilo de BD/Tiras presente nas duas pode ser considerado de Comix, alternativo e underground. Falam de estilos de vida, à sua maneira são subversivas e nelas a música tem uma presença quase vital. Preferem olhar a vida tal como ela é e são o oposto daquilo que representa a imprensa cor-de-rosa. As suas existências provam que existe alternativa ao comics super-heróico ou ao Franco-Belga escuteiro.


Em diversas intervenções, o Derrade demonstra um sentido de amor acutilante e nada sensível, não tem medo de ser mal compreendido e por isso mesmo ser prejudicado nos seus projectos futuros?

Se pretendo ser humorista não posso ter medo. Não é opção. Um Humorista com medo não existe. Quanto às más interpretações, tudo depende de quem lê, e o autor nisso não tem hipótese de controlar. Se eu disser "esta parede é branca" as más interpretações que daí possam ocorrer são inúmeras. É só quererem.


Classifique a HL para quem nunca pegou num exemplar (no fundo faça publicidade).

A HL Comix é uma revista de BD/Humor Alternativa e 100% Portuguesa. Para além disso têm artigos sobre Artistas/Obras de culto no campo da música, cinema, literatura. Se acha que a sua vida é triste venha ler a HL. Atreva-se! Pode ser corrosiva. Pode ser ácida. Pode ser bera. Pode ser desprezível. Pode ser a 8ª maravilha do mundo. Pode ser a janela para uma série de autores que se movimentam nas franjas do que é comercialmente aceitável. O que não é, nem nunca será, é mais uma revista alienada para com o que a rodeia.


Acha que a aposta numa revista deste género está a valer a pena? Que os portugueses se estão a rir mais graças ao seu trabalho?

Certamente que estão rir mais. Principalmente aqueles que se queixam que nunca se faz nada neste país e que, quando aparece a HL (ou outros projectos similares), não o apoiam, não a compram, não a divulgam, enfim matam o bebé (olá Pedro Santana Lopes) à nascença pois poderá não estar de acordo com a sua concepção de BD, e poderá mesmo ser uma ataque à sua inteligência (que a têm). Dito isto, não me estou a referir a ninguém em particular.


E é claro a pergunta que não pode faltar: Quais as suas expectativas em relação à HL?

As minhas expectativas em relação à HL Comix são enormes. Espero que ela se torne economicamente viável, que ela se torne num espaço onde outros autores possam publicar, e receber por isso, aquele material que dificilmente seria publicado em outros locais, que seja um exemplo de que é possível fazer uma revista de BD independente das vontades das editoras ou grupos de editoras que por formação ou deformação não respeitam a 9ª Arte.


Tem mais algum projecto na forja?

Todos os meus projectos centram-se em material a publicar na HL. Tenho um projecto que já acarinho desde 2002 e que seria um folhetim policial, em BD, uma espécie de mistura de Adéle Blanc-Sec do Tardi com o Twin Peaks do David Lynch, tudo com um grafismo semelhante ao do Sfar no Professeur Bell, ambientado na Lisboa dos anos 40 (pré, durante e pós 2º Guerra Mundial) e chamado provisoriamente LX40. O protagonista seria alguém com aquela doença de alergia à claridade, o que implicaria o uso do preto tornando a BD mais pesada e o corpo da personagem coberto de ligaduras. Ele seria também um pouco médium.


Se pudesse tomar alguma medida para mudar a situação da BD em Portugal, qual seria?

A nível estatal, governamental ou o que lá for a BD teria de ter tratamento igual ao das outras artes! Licenciaturas nas Universidades Públicas, encomendas estatais de trabalho, o regresso das bolsas de criação artística. Relevar o emprego da BD no ensino, não só em Português, onde se ensinaria os segredos da linguagem BD (quando estudava fazia parte do programa mas não era leccionado por ser dispensável...), como na Física, Matemática, História,... Como em Educação Visual (em 5 anos que tive esta disciplina nem uma única vez afloramos a BD, engraçado não é...). É na escola que se criam os novos leitores (obrigado mestre José Ruy pelos Lusíadas em BD, foram inestimáveis). É fora dela que se dá prestígio à BD: Rubricas semanais na TV PÚBLICA, já enviei duas revistas ao Professor Marcelo Rebelo de Sousa e népia, mas quando sai um novo Ásterix ou um novo número de uma revista mais intelectualóide, lá está ela a aparecer. Não se pode mudar a importância de uma arte por decreto, mas tanta discriminação já cheira mal.


Por fim, queríamos saber como é que vê a (má) situação pela qual a Banda Desenhada no nosso país atravessa.

A HL Comix está nas bancas. O BDJornal está nas bancas. Qual má situação? Realmente as revistas de Super-Heróis não estão a aparecer, mas o que isso significa? Que apesar da excelente oferta da Devir as vendas não o justificavam? Os Fumetti que por cá chegam via Brasil vendem quanto? Qual é a situação dos Disney? Em bruto quais são as vendas mensais da BD que chega às bancas? E nas livrarias com os álbuns e trade paperbacks? É outro mercado, talvez mesmo outro público, aquele que não perde tempo nas tabacarias a não ser para comprar o jornal e o tabaco, mas que vai às livrarias (bicho raro). Parece-me que embora a oferta seja diminuta em relação a outros países (Espanha seria um caso de estudo bastante interessante uma vez que França já está demasiado batido) a culpa da crise actual é a fuga de clientes. O público parece ter desaparecido. O que não se vende não se faz. Deixo-vos uma pergunta: quantos telemóveis têm e quanto gastam com eles todos os meses. Portugal é (foi?) o país do mundo com maior taxa de implantação de telemóveis. A inveja, a vaidade e o exibicionismo em Portugal faz ganhar dinheiro a muita gente.


Queríamos agradecer a disponibilidade, pois sabemos que é um homem muito ocupado. Pedimos desculpa se tomámos algum do seu precioso tempo, pois neste momento podia estar a salvar a humanidade. Muito obrigado.

2 comentários:

  1. Dárioooooooooo....minha porca!!!!!!!! é o Alex o teu companheiro de carteira no ISLA. Já vi qque te dedicaste aos bonecos a 100%. abraços Alvercagar!!!!! FIKA!!!

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  2. Quero aqui elucidar-vos. Este individuo que acima postou é professor de Matemática no ensino secundário. Depois admirem-se que os putos não aprendam nada...

    drd

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